Sunday, April 15, 2007

Imaginação


- Nem que te perdesse agora. Não percebes que não importa isso, não têm relevância as palavras soltas que possas dizer. Quando me ofendes sem que o percebas. Consegues, ao menos, ver isso?
- Repara, não podes perder o que nunca tiveste. E tu ainda não me tiveste. Não fomos um Nós, ainda nem somos um Eu e Tu. Somos um nada que não se assume. Somos dois corpos sem rumo. Sem Ser. Essência. Acho que é o que nos falta, uma Essência. Uma coisa que depois chamaríamos de Nossa. E aí sim. Aí perderias, aí sim essas tuas palavras fariam algum sentido. Percebes?
- Perco sim. Eu tenho-te ainda que não o saibas. És parte de mim e sabes como eu sei isso?
Sei porque revejo-te nas minhas coisas. Como podes dizer que não te possuo se estás dentro do meu olhar? Sabes o que é olhar outros rostos e ver o teu? Sabes o que é trazer o teu nome comigo? Em qualquer sítio, em todos os meus momentos. Estás TU. Por isso sim, eu tenho-te. Não como um objecto que podemos chamar de nosso. Não, não é isso. Tenho-te em mim. Parte de mim. Continuação da minha pele. Partilha da minha respiração, fraca por não te apoiares em mim totalmente. Estás comigo.
- Não tens. Não sou teu, não digas assim... Não dificultes as coisas. Não me tornes no que eu não sou. No que não podemos ser.
Sabes o que me preocupa? Que penses mesmo que podemos ser alguém. Um só. Como podes pensar que seremos felizes...
Eu não esqueço, não posso simplesmente. Tu sabes que sim. Que também te trago comigo, não és minha, mas eu trago-te em mim.
- Então porquê tornares tudo numa coisa impossível? Odeio coisas que se intitulam impossíveis.
Porque não podemos deixar-nos de teatro? Não suporto mais esta vontade. Este desejo que tenho que esconder como se fosse proibido gostar.
Não quero nem posso continuar a olhar-te sem te abraçar, a medir cada gesto que fazes, a doer-me por dentro quando me tocas. A ignorar que me viras a cara para evitar que sintas o mesmo que te descrevo assim, sem pudor.
- Não posso.
- Então é assim?
Queres que finja que não...é essa a tua palavra final. Ditas uma sentença aos dois, como se tivesses esse poder.
Queres que eu te apague de mim, que te retire à força do meu corpo. Que deixe de pensar em ti a todas as horas. Faço da tua vida minha, improviso diálogos que nunca iremos ter, conto-te o meu dia para que assim te sintas mais nele, para que percebas o quanto lhe pertences.
Não vês nos meus olhos a importância que tens? Não te vês reflectido neles? Não te assusta olhares-me e veres o teu próprio rosto. Fraco!
És um fraco.
- Sempre te disse quem era. Sempre te disse que não sou quem queres que eu seja, sou assim, destinado a ficar sozinho.
- Não vou sentir pena de ti, desculpa. Hoje, não consegues.
Desistes sem tentar. Sou eu que te trago, tu apenas aceitas o que o destino de dá, sem recusas ou amuos.
Não posso gostar de um fraco. Não posso querer comigo uma pessoa que não aceita que é especial. Tu não imaginas o quanto.
Desenho a nossa vida no pensamento, não sei se isto te acontece também, já vi que não. Eu imagino-te do meu lado. E sabes a verdade? Nesses meus sonhos estamos sempre a sorrir.
Pelos vistos, tu achas que merecemos apenas sofrer. Que devemos permanecer assim para sempre, não merecemos amar.
- Merecemos sim. Mais que ninguém. Eu conheço-te bem, talvez demasiado bem.
- Repetes o mesmo, insistes em rever o meu passado, passo por passo. Tornas esse meu episódio no mais importante. No único.
Desculpa, não posso apagá-lo. Não posso fingir que não aconteceu, que não te obriguei a assistir a cada passo. Também tu o fizeste, também tu me descreveste os teus sentimentos. Eu também os sei, também te conheço.
Ao contrário de ti, só te adoro mais ainda. Só protejo ainda mais a imagem desfocada do teu beijo.
- Desculpa.
Nem todos somos fortes.
Nem todos conseguimos aceitar ser felizes. Às vezes, o medo é maior.



Vai ser assim.
Vou gritar-te estas palavras.



/eu própria

2 comments:

Unknown said...

muito fixe sem dúvida

diálogo interessante e perspicaz e que diz assim muitas coisas juntas e dá que pensar e fazer rir

bjito **

mInErVa said...

E que bem que gritaste.
Muito bom o texto. Sentido e que faz sentir.
Bjo
MiN